sábado, 2 de abril de 2011

Uma vodca

- Uma vodca, por favor. Não, não. Duas vodcas, por favor! Eu já estava ali há meia hora encarando o cardápio. E tudo que consegui pedir foi a alforria que uma vodca, perdão, duas vodcas iam me proporcionar. Enquanto o garçom trazia os copos de alívio, tudo que eu me perguntava era: por quê? Primeiro copo, primeiro gole. Tem gente que vem pra ficar. Que não passa aleatoriamente pela vida, de quem se vai sentir falta. O segundo gole escorria pela garganta rasgando. Rasgando igual à dor. Você se dirigiu a mim quantas vezes? Uma, duas. No máximo, três. Nossa maior conversa durou o que? Umas três trocas de frases, cinco minutos de vida. Vida. Impressionante como ainda agora, mesmo sob o efeito do álcool, me lembro do que você dizia. Aquelas três frases que fizeram a diferença. Segundo copo, primeiro gole. Começo a rabiscar no guardanapo coisas sem sentido. Tem gente que vem tão forte, que tem tanta presença, que, mesmo partindo, permanece. E não se trata de permanência em nossa mente ou coração. Falo de presença física mesmo. Sabe quando a pessoa, embora não esteja mais ali, ainda faz parte da cena, do contexto? Aquele tipo que parece eterno? Que não se espera que chegue o fim... Me levanto da mesa e pago a conta. Volto pra beber o último gole com a sede de quem sofre, mas continua vivendo. E, escrito no guardanapo, leio: Sentirei sua falta... *Em memória de Francisco Solano Lopes e Pedro Villaverde