domingo, 31 de julho de 2011

Vermelho

Vermelho. O sol ardia no horizonte. Queimava o solo rachado, a árvore seca e a pele áspera de João. E na secura do sertão, uma lágrima rolava úmida pelo rosto do vaqueiro. 'Ave Maria, há de ser um lugar meió'. Face serena, alma calejada.E queimada. 'Importa não ir embora, aqui já nem urubu pousa mais'. Mas e Maria? 'Maria'. A moça de corpo moreno, não do sol, mas de nascença, fazia sua alegria. Lembrava de sua conquista. Maria tinha sido a única vitória de sua vida. Momento único, em que foi homem e não rato. 'Por que, meu Deus?'. A pergunta vinha enquanto mirava o céu ruivo. Deixar tudo para trás. No bolso da calça, a fé. A esperança não cabia ali. 'Como pode Deus, nosso senhor, deixar a vida se acabar assim? Seca, sem vida, sem sombra'. Ah, a sombra de um cajueiro lhe faria bem. Sentar-se debaixo de uma frondosa árvore, comer seu fruto e sorver sua água. Talvez assim amenizasse a febre que lhe queimava o corpo. Ou teria o sol se rebelado contra o sertanejo? O corpo ressecado e ressentido se curvava. O solo lhe puxava, como que pedindo um colo, um afago fraterno, a união de dois irmãos de luta. De joelhos, João rogava a Nossa Senhora que o levasse para um lugar bão. E pensava 'Jesusinho não ia me deixar assim'. O sol ardeu mais do que nunca. E depois parou. Um fio de vida escorreu úmido, límpido, impiedoso pela pele rachada do vaqueiro. E então, secou.